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sábado, 3 de julho de 2010

Um Profeta (Un Prophète - 2009) - Há recompensa no crime?



Seria aceitável que, moralmente falando, nos permitissemos conduzir a inconsistente e corrosiva degradação de nossa personalidade, nos deixando influenciar a ponto de sermos guiados pelas tenebrosas sendas do crime? Meu Código de Moral e Princípios (não escrito) aponta isso como um atestado de incapacidade, burrice e ingenuidade. Se um criminoso não terminar sua infame existência tombando em uma vala, vai terminar atrás das grades. A estrada de quem coleciona inimigos só se bifurca para estes dois lados. Um atalho implicaria medo e anonimato perpétuos. É bom viver assim? Perguntem a Juan Carlos Ramirez Abadía.

Em nível de Brasil, ainda é possível que possamos ganhar algum dinheiro honestamente e, quem sabe, atingir uma confortável estabilidade financeira. Pode ser que demore um pouco, mas é bem mais interessante. Se não roubamos, matamos ou viciamos quem quer que seja, a forma como nos conduzimos em nossas vidas e gastamos nosso dinheiro só dirá respeito a nós mesmos. Poderemos estufar o peito e dizer: “Sou uma pessoa digna. Não devo nada a ninguém. Tudo o que tenho foi à custa de muito trabalho honesto”. Meu modelo de exemplo é uma pessoa que atenda a esses atributos.

Não vou pormenorizar e, muito menos, classificar modalidades de criminosos, pois esse não é o propósito do presente post. Tudo o que disse até agora foi para servir de introito a um comentário de um filme que acabei de ver. O nome do filme é Um Profeta (Un Prophète – 2009). Dirigida por Jacques Audiard, a película nos conduz ao onírico pesadelo de quem vive atrás das grades. Aucunhada de "Carandirú Francês" a pelicula de Jacques Audiard, ao que me parece, foi injustamente taxada. Hector Babenco, com toda sua prepotência argentina, perto do diretor francês, é menor que uma formiga. No meu ponto de vista, a adaptação do romance de Dráuzio Varela não está à altura do livro. É bem verdade que Carandirú é um filme realista, mas um comparativo seria uma injustição com o filme francês.

Um Profeta tem um argumento bem mais consistente e, via de consequencia, um roteiro bem mais trabalhado, brilhantemente trabalhado pelas mãos do próprio diretor e de Thomas Bidegain. O filme não glamouriza a vida atrás das grades, mas trata, ainda que paradoxalmente, de forma imparcial e explicita, a importância de se seguir regras em um sistema que vive à margem de uma sociedade legalmente constituida, onde, achamos por bem, fechar os olhos.

O que eu posso dizer sobre o filme? Primeiro, uma breve sinopse: El Djebena, cujo papel ficou a cargo do talentoso Tahar Rahim, é um jovem de ascendência árabe que vai cumprir pena em uma penitenciária francesa. Chegando lá, ele logo demonstra sinais de fraqueza, o que o leva a cair nas graças de César Luciani, um máfioso corso interpretado pelo brilhante Niel Arestrup, espécie de manda chuva dentro do presídio. Como uma espécie de pau mandado, ele é contratado para um serviço, onde seu pagamento será, simplemente, a preservação da sua vida. A recusa significa morte. Seguindo-se a isso, toda a linearidade do filme seguirá embasada em como ele se portará diante de outros serviços feitos a mando do mafioso. O final, em que pese o clichê, é enigmático e deixa alguma coisa no ar.

O título do filme, o qual designa o personagem princípal (de ascendênia árabe, não esqueçam), é uma clara metáfora a Maormé, onde o presídio viria a ser a montanha, além de haver, em uma clara alusão ao alcorão, uma entidade que lhe sussurra coisas, como o suposto anjo visto pelo ícone mulçumano, o fazendo crer que tais palavras serviriam para ele, de alguma forma, redimir o mundo. Só faltou El Djabena ser epiléptico. Aí era demais, não era? Mesmo assim, o personagem era chegado em umas guloseimas ilegais, o que pode, de longe, ter algum paralelo com visões suspeitas. Há, leiam o interessante Versos Satânicos, de Salman Rushdie, uma critica sinica e explicita à religião islâmica. Eu o estou lendo e, até onde li, sei que merece uma indicação.

Encerrando, as demais atuações do filme são tão inigualáveis quanto convicentes, além de montagem, ediçao, fotográfia e os demais qualificativos já apontados, simplesmente ótimos. De todos os indicados ao Oscar 2010 de melhor filme estrangeiro, esse foi o primeiro que eu assisti. Qundo assistir o filme do conterrâneo de Babenco direi se estava à altura ou não de Um Profeta, mas sei que, por ser muito pouco provável, dificilmente as pessoas dirão que ele é melhor.

Ao assistir Um Profeta a gente entende e tem certeza que o bom cinema europeu, de um modo geral, tem uma estética diferenciada, bem longe filmes comérciais americanos, pelo menos em sua grande maioria.



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